LUZ PARA ILUMINAR AS NAÇÕES (São José Era Assim... Capítulo IX)


LUZ  PARA  ILUMINAR  AS  NAÇÕES

 
Os pastores falariam de sua descoberta a todos aqueles que eles encontrassem, e todos se espantariam. Eles foram, durante o dia e nos dias seguintes, fazer visitas à manjedoura. Maria e José acolheram os visitantes com toda sua amabilidade. Certamente, havia em Belém, assim como em Jerusalém, corações ávidos de Deus e que esperavam o Messias. O Espírito Santo os iluminava para conduzi-los à descoberta do Salvador. As palavras: eles encontraram, eles descobriram, retornam amiúde no Evangelho a propósito das primeiras manifestações do Salvador. Há aqueles que simplesmente viram o menino, e aqueles que o descobriram, isto é, que viveram um encontro pessoal. A presença de Maria e de José facilitava essa descoberta.
Após haver dito que os pastores voltaram para suas casas glorificando a Deus, São Lucas logo ajunta: “Quando se cumpriram os oito dias para a circuncisão do menino, foi-lhe dado o nome de Jesus, como indicara o anjo antes da sua concepção” (Lc 2,21). Admira-nos esse laconismo; nem José, nem Maria entram em cena. Que diferença com aquilo que o mesmo São Lucas diz da circuncisão de João Batista. Para João, parentes e amigos vêm nomeados; querem dar à criança o mesmo nome de seu pai, Zacarias, a mãe protesta: é preciso chamá-lo João. As pessoas não ficam convencidas, perguntam por sinais a opinião do pai. Este, pede uma tabuinha e escreve: João é seu nome! Imediatamente, solta-se a sua língua e ele agradece ao Senhor. A novidade espalha-se pelas montanhas; todos comentam. Perguntam uns aos outros: “o que você acha que virá a ser esse menino”?
Para Jesus, nenhuma entrada solene, pois a circuncisão do Salvador tem um sentido completamente diferente. O rito da circuncisão tem o sentido de purificação e de pertença ao povo escolhido. Para Jesus, longe de ser purificado, é ele que purifica, é ele que concede a seu povo a faculdade de ser o povo escolhido. Assim, São Lucas sublinha apenas a imposição do nome. Essa imposição do nome é a tomada de posse do menino por seus pais, e a manifestação oficial desse nome a todo o povo.
Maria e José receberam, cada qual separadamente, a ordem de dar ao menino o nome de Jesus. É Deus, por seu anjo, que deu essa ordem a Maria e depois a José. Ele não disse: o menino chamar-se-á Jesus, mas: “Tu lhe darás o nome de Jesus” (Lc 1,31; Mt 1,21). Impor um nome a alguém, no sentido bíblico, significa tomar posse. Essa criança pertence primeiro a Deus, assim, é Deus quem escolhe o nome para seu Filho, nome indicativo da sua missão. Vem daí que, cada um por sua vez, Maria e José deram nome à criança nascida em Belém. Ao dar um nome ao seu menino, Maria reconhece ser sua mãe; paralelamente, José, ao dar um nome à criança nascida de sua esposa, ao fazê-lo em nome de Deus, reconhece uma paternidade sobre esse menino, ele é seu pai por ordem de Deus.
O oitavo dia depois do Natal, dia em que foi realizada a circuncisão, é consagrado, no ano litúrgico, a celebrar especialmente a maternidade de Maria. A festa da circuncisão mostra que Jesus foi verdadeiramente formado dentro do ventre de uma mãe como todas as crianças, com todas as características dos filhos dos homens. São Paulo dirá: “Nascido de uma mulher” (Gl 4,4). Maria é verdadeiramente mãe, ela o é com toda a força do termo. Ela não tem simplesmente uma maternidade de empréstimo como pretendiam certos hereges; eles diziam que o Cristo nada mais fizera que passar pelo ventre de Maria sem ter sido formado por ele.
O nome Jesus significa: Deus salva. É todo um programa e a comprovação de uma sublime realidade. Jesus presente em nosso mundo é a libertação, a salvação que começa. Esse nome de Jesus dado à criança, deve ter parecido um pouco pretensioso às pessoas em Belém, e mais tarde em Nazaré, mas muito mais ele deve ter parecido promissor àqueles que sabiam. Que doçura devia ter o nome de Jesus no coração e nos lábios de José e de Maria! Eles tinham sido os primeiros a conhecer esse nome; eles o haviam recebido da boca de um anjo.
São Bernardo disse que o nome de Jesus era: “mel para a boca, música para os ouvidos, júbilo para o coração”, e que era “uma luz, um alimento, um remédio” (Cant. 15,5). Que dizer de Maria e de José quando eles pronunciavam esse nome! São Paulo, esse grande apaixonado por Cristo, escrevia aos cristãos da aldeia de Filipos, na Macedônia: “Que ao nome de Jesus todo joelho se dobre nos céus, na terra e nos abismos; que toda língua proclame que Jesus Cristo é Senhor para a glória de Deus Pai” (Fl 2,10).
Após ter falado da imposição do nome de Jesus no dia da circuncisão, São Lucas fala da viagem de Maria e de José ao templo de Jerusalém para a apresentação do menino. Essa página, é uma daquelas que melhor põem em relevo a pessoa de São José no mistério do Verbo encarnado. Todos os termos que indicam uma ação estão no plural; eles se referem a Maria e a José. A purificação da mãe e a apresentação do menino são o motivo da viagem a Jerusalém, mas, no caso, são os nomes das cerimônias.
O que mais interessa ao evangelista é o encontro com o velho Simeão e a profetiza Ana. Assim, as igrejas do Oriente celebram esse acontecimento sob o título de Hypapante do Senhor, o encontro do Senhor. É, como para os pastores e mais tarde para os magos, a descoberta do Senhor com toda a alegria e as conseqüências que dela derivam. Nós chamamos a essa festa das Candeias por causa das velas, símbolos de Cristo, luz do mundo. O título de Purificação de Maria é impróprio, a Toda-Pura não podia ser purificada. O de Apresentação do Senhor não diz nada de mais, pois Jesus não se apresenta, é José e Maria que vão ao templo para apresentá-lo.
É evidente que Maria e José não estavam obrigados às exigências da Lei de Moisés concernente à purificação das mamães e ao oferecimento dos recém-nascidos. Como para a circuncisão, José e Maria aceitam as prescrições da Lei, em nome da criança, pois Jesus veio, como ele dirá mais tarde, para cumprir a Lei, e não para subtrair-se dela. É ele que purifica, é ele que resgata, pois ele é a expiação de todos.
Trinta e três dias após a circuncisão do menino, isto é, quarenta dias após o seu nascimento, a mãe devia oferecer um sacrifício: um cordeiro de um ano ou, se ela fosse pobre, dois pombinhos. O sacrifício podia ser oferecido por procuração; a presença da mãe em Jerusalém não era, portanto, obrigatória, mas os judeus piedosos gostavam de ir ao templo para as cerimônias de purificação. O texto do Evangelho diz: “para oferecer em sacrifício, segundo a Lei do Senhor, um par de rolas ou dois pombinhos”. Logo, Maria e José eram pobres e como tais reconhecidos diante de todos. Ademais, o cordeiro, o verdadeiro, aquele que tira os pecados, é o próprio Jesus.
Já que a presença da mãe não era estritamente obrigatória, a da criança e do pai, muito menos. A sagrada família poderia ter ficado em Belém. Para José e Maria, tratava-se bem mais do que de uma formalidade; era o cumprimento dos desígnios eternos de Deus sobre o mundo. Em nenhum momento de sua existência Jesus, Maria e José estiveram tão intimamente unidos em uma mesma ação oblativa. O texto traz: “Quando se cumpriram os dias para a purificação deles, segundo a Lei de Moisés, eles o levaram a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor” (Lc 2,22).
Fala São Lucas da purificação deles, isso engloba Jesus, Maria e José; eles estão isentos dos embaraços impostos para a proteção das jovens mamães e de seus bebês. Eles o levaram a Jerusalém: é Jesus que é levado, e é José e Maria que o levam. Ambos querem apresentá-lo: Jesus pertence a um e a outro pois ele é primeiro de Deus. Ele pertence a Deus como Verbo eterno, e também como primogênito da Virgem Maria. O Senhor tinha reservado para si todo menino primogênito de uma família.
De Belém até Jerusalém, há bem duas horas de marcha. Carregando Jesus, sem dúvidas um pouco cada um, José e Maria deviam recordar a profecia de Malaquias que se cumpria através deles naquele momento: “Logo virá ao seu templo, o Senhor que vocês procuram; o anjo da aliança, que vocês desejam” (Mal 3,1). Puderam, então, perguntar-se se o menino seria reconhecido como o anjo da aliança e como seria acolhido no templo. Não tardariam a descobri-lo.
No momento em que entraram no templo, desde a ala das mulheres, José e Maria viram um homem vir ao seu encontro todo contente. Esse homem, Simeão, os esperava. Era um homem justo e temente a Deus, à espera da consolação de Israel. Tinha-lhe sido revelado que não haveria de morrer sem ter visto o Cristo do Senhor. Movido pelo Espírito Santo, ele viera ao templo e quando viu José e Maria carregando Jesus, ele foi até eles e, tomando o menino em seus braços, pôs-se a cantar seu reconhecimento:
            “Agora, ó Mestre, deixa partir em paz teu servidor
            segundo a tua palavra,
            pois meus olhos viram a tua salvação,
            que preparaste em favor de todos os povos;
            luz para iluminar a nações
            e glória de teu povo Israel” (Lc 2,29).

Diante dessa acolhida que ultrapassa toda previsão, José e Maria ficam maravilhados, diz São Lucas. Ele, que falou da concepção virginal do menino no dia da anunciação, não teme dar aqui o nome de pai e de mãe a José e a Maria. É a primeira vez que o nome de pai é dado a José no Evangelho. Quer dizer que José merece esse título, não pela carne, mas na perspectiva da ação do Espírito Santo. Ele é pai de uma maneira que não se assemelha a nenhuma outra.
Simeão abençoa a ambos. Esse termo de bênção inclui felicitações proferidas por iniciativa do Espírito Santo. Como Isabel fizera para Maria, Simeão deve felicitar José e Maria por terem acreditado que o Senhor cumpriria suas promessas. Ele os cumprimenta por terem confiado em Deus. Depois disso, sempre por iniciativa do Espírito, Simeão dirige-se diretamente à mãe para determinar o papel do Messias, com todas as conseqüências que decorreriam para ela mesma.
A José o anjo havia anunciado que o Messias salvaria o povo dos pecados, para dizer que o caminho da glória seria costeada de sofrimentos. A Maria não disse nada disso. O anjo havia falado do trono de Davi, de um reino eterno e de um nome glorioso. Na seqüência dos acontecimentos, havia acentuado a nota de alegria: felicitações de Isabel, Magnificat, canto dos anjos no Natal, vinda dos pastores, etc.
Entrementes, como que em segredo, o Senhor prepara a Virgem para os sofrimentos que a esperam, a ela e a seu filho. Simeão lhe diz: “Eis aquele que foi colocado para a queda e o reerguimento de muitos em Israel, e como sinal de contradição. E tua alma será traspassada por um gládio, assim serão revelados os pensamentos de numerosos corações” (Lc2,35). Maria torna-se, assim, modelo e sustento para aqueles que, dali em diante,  estarão submetidos à contradição e terão seus corações traspassados.
Como que para adocicar as últimas palavras de Simeão, surge uma santa viúva, a profetiza Ana, que apesar de seus oitenta e quatro anos, servia ao Senhor dia e noite com jejum e oração. Ela pôs-se a louvar a Deus e a falar do menino para todo mundo. Ela se dirigia “a todos aqueles que esperavam a libertação de Jerusalém”. Infelizmente, São Lucas não refere nenhuma de suas palavras. Gostaríamos de saber o que ela disse a Maria e a José, e mais ainda, o que eles teriam dito nessa circunstância inesquecível.